Marco Regulatório | TCE-MT
Peça-chave na prevenção e controle de doenças, agentes comunitários de saúde (ACS) e de combate às endemias (ACE) abrem as portas de acesso ao Sistema Único de Saúde (SUS) mesmo nos cantos mais remotos do país. Expostos aos desafios das longas distâncias e ao risco de contaminação, estes profissionais ainda travam uma luta Brasil afora pelo reconhecimento de seus direitos, regulamentados há 18 anos. Em Mato Grosso, a batalha foi encerrada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), que estabeleceu marco regulatório e unificou o entendimento acerca da legislação em todos os 142 municípios. Na prática, isso garante, dentre outros, a formalização do vínculo profissional, remuneração, pagamento de insalubridade, certificação e aposentadoria, a 5.107 ACSs e 2.041 ACEs.
Homologada por unanimidade pelo Plenário
em 17 de outubro, a medida foi relatada
pelo presidente do órgão, conselheiro Sérgio Ricardo,
extinguindo falhas nas interpretações da Lei 11.350/06
(Ruth Brilhante) e da Emenda Constitucional 120/2022.
Em agosto de 2023 a questão havia sido levada à mesa técnica por solicitação de Sérgio Ricardo, motivado por consulta feita pela Prefeitura de Jangada, que tinha dúvidas sobre os pagamentos das categorias. Sindicatos, prefeituras, Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM), Assembleia Legislativa (ALMT) e Secretaria de Estado de Saúde (SES-MT) discutiram o tema em 11 reuniões que ajudaram o TCE a construir uma solução.
“Antes do marco regulatório, nem todos os agentes recebiam insalubridade. Mas todos eles estão expostos a risco de contaminação por doenças e precisam receber, está na lei. O mesmo se aplica ao piso salarial. Algumas prefeituras não pagavam o piso determinado por lei, isso não pode. Todas essas questões foram dirimidas por esta decisão”, explicou o presidente ao lembrar que os repasses são oriundos do Governo Federal.
A notícia não poderia sair em melhor hora. Em portaria publicada no Diário Oficial da União, o Ministério da Saúde (MS) anunciou recentemente reajuste anual com base no aumento de 7,7% do salário-mínimo em 2023 (R$ 1.412,00), contemplando o piso nacional das categorias, de dois salários-mínimos. Esse é um dos motivos para que a ACS Dinorá Magalhães Arcanjo afirme que o marco é um sonho transformado em realidade.
acontecem em outros estados do Brasil, mesmo que, no caso do piso salarial,
por exemplo, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) já tenha apontado que o valor
é aplicável aos servidores dos estados, do Distrito Federal e dos municípios,
independentemente do regime jurídico a que estiverem vinculados.
Em Mato Grosso, até que as atividades fossem devidamente reconhecidas, um longo caminho foi pavimentado por reuniões, articulações e uma série de posicionamentos emblemáticos dos conselheiros. Por mais de 10 anos, o TCE-MT foi palco para este debate, que ganhou força no ano passado, quando representantes das categorias de diversos municípios buscaram o auxílio do controle externo.
Em um dos encontros, o prefeito de Alto Araguaia, Gustavo Melo, comemorou decisão sobre a certificação dos agentes e assegurou que criaria um plano de cargos e salários. “A partir de hoje, os agentes, que são importantíssimos na condução de uma gestão, passam a ter segurança jurídica. É uma decisão acertada, agora temos a liberdade e a confiança para criar um plano de cargo e salário para as categorias.” Agora, uma cartilha do TCE-MT descomplica a interpretação dos gestores sobre o assunto. Os tópicos de destaque no material, lançado neste dia 29 de abril, incluem a realização de processos seletivos, efetivação e aposentadoria dos profissionais, o que deve estar no radar de prefeituras como a de Várzea Grande, que recentemente homologou resultado de concurso, e de Cuiabá, que está com inscrições abertas para a seleção.
No verão brasileiro, quando os casos de dengue, zika e chikungunya se multiplicam, o papel dos ACS e ACE ganha status de sobrevivência. Isso porque, segundo o Ministério da Saúde, cerca de 75% dos focos de proliferação do mosquito transmissor ficam dentro de casa e são eles os responsáveis por bater de porta em porta e identificar potenciais criadouros do aedes aegypti.
Há quase 30 anos na linha de frente da Atenção Primária, Dinorá faz parte deste time de heróis quase desconhecidos, sem os quais os 31.174 casos de dengue, zika e chikungunya registrados neste ano em Mato Grosso poderiam ser muito maiores. De acordo com o plano de contingência da Secretaria de Saúde, a cobertura do serviço abrange 75% da população mato-grossense.

“Vamos de casa em casa levando os mais diferentes tipos de serviços à população. Nós levamos a notícia para lá e de lá trazemos o serviço, somos o diálogo entre o morador e o serviço de saúde e, quando somos valorizados, trabalhamos melhor, mais imbuídos, dedicados, por entendermos que nossa profissão é importante, houve reconhecimento, eu sonhava com isso”, diz ela.
Não à toa, os agentes comunitários também foram reconhecidos como profissionais da saúde, a partir da sanção da Lei 14.536, em janeiro de 2023, passando a ter no horizonte a possibilidade de progressão nas suas funções. O desenvolvimento também é amparado pelo marco regulatório do TCE-MT, que prevê que a cada dois anos eles frequentem cursos de aperfeiçoamento. “Em um país onde se vive uma crise de saúde, esses agentes são, na maioria das vezes, o único acesso entre as comunidades carentes e os serviços de saúde. Para muitos, eles representam a distância entre a vida e a morte”, conclui Sérgio Ricardo ao destacar que o Tribunal de Contas segue atento à questão, fiscalizando o cumprimento da norma junto aos municípios.