ASSUNTO:REPRESENTAÇÃO DE NATUREZA INTERNA COM REFORMA DE MEDIDA CAUTELAR
REPRESENTANTE:SECRETARIA DE CONTROLE EXTERNO DE ATOS DE PESSOAL
REPRESENTADO:SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE CUIABÁ-MT
RESPONSÁVEIS:EMANUEL PINHEIRO – PREFEITO DO MUNICÍPIO DE CUIABÁ
HUARK DOUGLAS CORREA – EX-SECRETÁRIO MUNICIPAL DE SAÚDE (14/03/2018 - 4/12/2018)
ELIZETH LUCIA DE ARAÚJO – EX-SECRETÁRIA MUNICIPAL DE SAÚDE (20/01/2017 A 13/03/2018)
INTERESSADO:LUIZ ANTÔNIO POSSAS DE CARVALHO – SECRETÁRIO MUNICIPAL INTERINO DE SAÚDE (5/12/2018 – DIAS ATUAIS)
ADVOGADO:NESTOR FERNANDES FIDELIS – OAB/MT 6.006
Tratam os autos de Representação de Natureza Interna, proposta pela Secretaria de Controle Externo de Atos de Pessoal, em desfavor da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá, referente a supostas irregularidades na contratação de servidores temporários sem justificativa de excepcional interesse público, sem prévio Processo Seletivo, em número acima dos limites de vagas previstas em lei (KB17, KB01, KB06) e sem o envio de informes a este Tribunal, tanto dos eventuais processos seletivos públicos, como dos atos de admissões de 2.733 agentes contratados (MB02).
Após a análise do Relatório Técnico Preliminar, decidi pela concessão de Medida Cautelar por meio do Julgamento Singular 671/JJM/2018, publicado no Diário Oficial de Contas, edição 1414, em 8/8/2018, o qual foi homologado pelo Tribunal Pleno, através do Acórdão 334/2018 - TP, publicado no Diário Oficial de Contas, edição 1435, em 6/9/2018, determinando o seguinte:
1) à Prefeitura Municipal de Cuiabá, na pessoa de seu gestor, que suspendesse qualquer espécie de contratação temporária, sem processo simplificado ou concurso público correlato, no âmbito da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá, advertindo-o de que, no caso de desobediência, estaria sujeito à multa diária no montante de 10 UPFs/MT, nos termos do artigo 297, § 1º, da Resolução 14/2007; 2) a citação dos Srs. Emanuel Pinheiro, Huark Douglas Correia e Elizeth Lúcia de Araújo, encaminhando-lhes cópia integral da Representação de Natureza Interna, a fim de que fosse assegurado o direito de defesa sobre os fatos apontados no Relatório Técnico Preliminar, no prazo máximo de 15 dias, como determina o artigo 61, § 2º, da Lei Complementar 269/2007; 3) à atual gestão do órgão fiscalizado, com observância ao referido prazo de 15 dias concedidos para manifestação, que: a) enviasse o lotacionograma com todos os cargos, já criados e existentes, da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá; b) encaminhasse, de forma detalhada, a relação dos cargos preenchidos tanto por contratações temporárias como por servidores efetivos e comissionados da Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá; c) remetesse, em apartado e conforme disciplina o manual de orientação para remessa de documentos a este egrégio Tribunal (Manual de Triagem), os atos de admissão e os processos seletivos simplificados elaborados para provimento dos 2.733 servidores contratados temporariamente; d) apresentasse as justificativas para comprovação da necessidade temporária de excepcional interesse público para realização das 2.733 contratações temporárias; e, e) comprovasse a prévia existência de dotação orçamentária e a demonstração do impacto orçamentário/financeiro, considerando o limite prudencial de gastos com pessoal do município de Cuiabá e as contribuições previdenciárias dos servidores temporários (RGPS), em contraste com as dos servidores efetivos (RPPS);
Ademais, em cumprimento ao princípio do contraditório e da ampla defesa e nos termos dos artigos 6º e 61, § 2º, da Lei Complementar 269/2007; e artigos 89, VIII e 140, da Resolução 14/2007, foram determinadas as citações dos representados para conhecimento e manifestação acerca dos 4 achados de Auditoria (KB17, KB01, KB06 e MB02), de natureza grave, constantes no Relatório Técnico Preliminar.
Por conseguinte, o Senhor Huark Douglas Correa, ex-Secretário Municipal de Saúde de Cuiabá, apresentou requerimento de modificação da tutela de urgência. Para tanto, alegou que a impossibilidade de contratação imposta por este Tribunal prejudicaria as unidades de saúde, em razão da ausência de profissionais.
Informou que o procedimento para a realização do Processo Seletivo Simplificado, sob o número 025.341/2018, foi finalizado junto à Secretaria Municipal de Gestão.
Por fim, apresentou os pedidos colacionados abaixo, a fim de que um deles fosse acatado de modo a solucionar o caos da saúde municipal até que o Processo Seletivo Simplificado fosse deflagrado:
a) A imediata suspensão da Medida Cautelar que proibiu esta Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá de realizar qualquer tipo de contratação temporária de profissionais, onde que todos os profissionais que forma e/ou serão contratados posteriormente serão substituídos por aqueles que alcançar à aprovação no Processo Seletivo Simplificado;
b) Caso não entenda dessa maneira, solicitamos a autorização para a Contratação Temporária de Profissionais Médicos e Profissionais de Enfermagem por prazo determinado visando atender o excepcional interesse público, até que o Processo Seletivo Simplificado seja realizado e todos os servidores temporários sejam substituídos por aqueles que obtiveram aprovação no Certame Público;
c) Caso assim não concorde, solicitamos a realização de um Termo de Ajustamento de Conduta onde nos autorize a realizar contratações temporárias sob a premissa de respeitar requisitos a serem formulados por esse Tribunal de Contas Estadual.
Instada a se manifestar, a Equipe Técnica asseverou que até o momento a Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá não teria comprovado, perante este Tribunal, a necessidade temporária, de excepcional interesse público, que ocasionou as contratações diretas, sem Processo Seletivo Simplificado, concernentes à irregularidade KB01, razão pela qual entendeu pelo indeferimento da modificação da Medida Cautelar, mantendo-se incólume o Acórdão 334/2018-TP.
Em sequência, decidi pelo acréscimo de determinações cautelares por meio do Julgamento Singular 1142/JJM/2018, publicado no Diário Oficial de Contas, edição 1502, em 12/12/2018, o qual foi homologado pelo Tribunal Pleno, através do Acórdão 589/2018 - TP, publicado no Diário Oficial de Contas, edição 1510, em 26/12/2018, determinando o seguinte:
I) à Prefeitura e às Secretarias Municipais de Saúde e de Gestão de Cuiabá, nas pessoas dos seus gestores, que no prazo de cinco dias apresentassem, nos autos, o “Demonstrativo Analítico do Lotacionograma – Anexo XI”, consoante determina o Manual de Triagem, com cópia das respectivas leis de criação dos respectivos cargos, de 2014 a 2018, da forma exposta à fl. 24 da decisão; II) a notificação do Sr. Emanuel Pinheiro, para que abra crédito adicional para realização de Processo Seletivo Simplificado; III) a notificação dos Srs. Emanuel Pinheiro e Ozenira Félix Soares de Souza, para que, sob pena de multa diária no montante de 10 UPFs/MT, nos termos do artigo 297, § 1º, da Resolução 14/2007 e artigo 311, IV, do Novo Código de Processo Civil, c/c o artigo 144 da Resolução 14/2007-TP, que: a) deflagrassem o Processo Seletivo Público concernente aos Processos Administrativos 025.341/2018-1 e 043.310/2018-1, publicando o edital em até cinco dias, observando-se os requisitos legais e constitucionais para a lisura, publicidade, impessoalidade e competitividade do certame; e, b) encaminhassem, no prazo de até 15 dias, nos termos do artigo 306 do Novo Código de Processo Civil, c/c o artigo 144 da Resolução 14/2007, cópia integral dos autos dos Processos Administrativos 025.341/2018-1 e 043.310/2018-1, referentes ao Processo Seletivo Público de 2018, bem como as justificativas da sua não deflagração até aquele momento; IV) a notificação dos Srs. Luiz Antônio Possas de Carvalho, Emanuel Pinheiro e Ozenira Félix Soares de Souza para que, sob pena de multa diária no montante de 10 UPFs/MT, nos termos do artigo 297, § 1º, da Resolução 14/2007, encaminhassem, no prazo de até 15 dias, a proposta de cronograma de concurso público para o provimento de cargos da área da saúde, enfatizando sua área fim; V) a notificação dos Srs. Luiz Antônio Possas de Carvalho, Emanuel Pinheiro e Ozenira Félix Soares de Souza para que encaminhassem, no prazo de até 15 dias, cópia integral de todos os contratos temporários vigentes e de todas as rescisões contratuais, pedidos de exoneração e licenças realizadas no exercício de 2018, até a presente data;
Sem demora, sobrevieram aos autos as defesas dos Representados, razão pela qual, encaminhei o presente processo à SECEX de Atos de Pessoal para emissão do Relatório Técnico Conclusivo.
Ocorre que, após a análise da documentação, a Equipe de Auditoria emitiu Relatório Técnico alertando o não cumprimento das Determinações III.a, III.b e IV contidas no Acórdão 598/2018 – TP, proferido em sede de Medida de Urgência, conforme quadro abaixo:
III) a notificação dos Srs. Emanuel Pinheiro e Ozenira Félix Soares de Souza, para que, sob pena de multa diária no montante de 10 UPFs/MT, nos termos do artigo 297, § 1º, da Resolução 14/2007 e artigo 311, IV, do Novo Código de Processo Civil, c/c o artigo 144 da Resolução 14/2007-TP, que:
a) deflagrassem o Processo Seletivo Público concernente aos Processos Administrativos 025.341/2018-1 e 043.310/2018-1, publicando o edital em até cinco dias, observando-se os requisitos legais e constitucionais para a lisura, publicidade, impessoalidade e competitividade do certame; e,
b) encaminhassem, no prazo de até 15 dias, nos termos do artigo 306 do Novo Código de Processo Civil, c/c o artigo 144 da Resolução 14/2007, cópia integral dos autos dos Processos Administrativos 025.341/2018-1 e 043.310/2018-1, referentes ao Processo Seletivo Público de 2018, bem como as justificativas da sua não deflagração até aquele momento;
IV) a notificação dos Srs. Luiz Antônio Possas de Carvalho, Emanuel Pinheiro e Ozenira Félix Soares de Souza para que, sob pena de multa diária no montante de 10 UPFs/MT, nos termos do artigo 297, § 1º, da Resolução 14/2007, encaminhassem, no prazo de até 15 dias, a proposta de cronograma de concurso público para o provimento de cargos da área da saúde, enfatizando sua área fim;
É o Relatório.
Decido.
Analisando o presente caso, observo que as Determinações III.a, III.b e IV contidas no Acórdão 598/2018 – TP, deveriam ter sido cumpridas no mês de dezembro do ano passado, há mais de 6 meses atrás.
Conforme consta na Informação Técnica, emitida pela SECEX de Atos de Pessoal (Doc. Digital 141067/2019), até o momento a Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá não comprovou o cumprimento das referidas determinações perante este Tribunal.
Assim, passo a descrever os descumprimentos apontados pela SECEX, em cotejo com as defesas anteriormente apresentadas:
III) a notificação dos Srs. Emanuel Pinheiro e Ozenira Félix Soares de Souza, para que, sob pena de multa diária no montante de 10 UPFs/MT, nos termos do artigo 297, § 1º, da Resolução 14/2007 e artigo 311, IV, do Novo Código de Processo Civil, c/c o artigo 144 da Resolução 14/2007-TP, que:
a)deflagrassem o Processo Seletivo Público concernente aos Processos Administrativos 025.341/2018-1 e 043.310/2018-1, publicando o edital em até cinco dias, observando-se os requisitos legais e constitucionais para a lisura, publicidade, impessoalidade e competitividade do certame; e
b)encaminhassem, no prazo de até 15 dias, nos termos do artigo 306 do Novo Código de Processo Civil, c/c o artigo 144 da Resolução 14/2007, cópia integral dos autos dos Processos Administrativos 025.341/2018-1 e 043.310/2018-1, referentes ao Processo Seletivo Público de 2018, bem como as justificativas da sua não deflagração até aquele momento;
A determinação posta na letra “a” foi proferida em razão da situação alarmante vivida pela saúde municipal. Levei em consideração as alegações trazidas pelo ex-Secretário Municipal de Saúde, Senhor Huark Douglas Correa, quando da ausência dos profissionais, o que estaria prejudicando as unidades de saúde.
Considerando ainda a informação de que o Procedimento 025.341/2018, referente à realização do Processo Seletivo Simplificado, encontrava-se finalizado junto à Secretaria Municipal de Gestão, bem como, o relevo social da matéria envolvida, foi fixado o prazo de 5 dias para o seu cumprimento.
Ocorre que, até a presente data, o referido certame não foi deflagrado.
Já a determinação da letra “b” foi aplicada tendo em vista a informação encaminhada pela ex-Secretária Municipal de Saúde, Senhora Elizeth Lúcia de Araújo, de que o procedimento para a realização do processo seletivo simplificado já estava em andamento.
Desse modo, seria necessário o encaminhamento da citada cópia a este Tribunal, para melhor visualização dos atos já praticados pela Administração Pública para a sua deflagração.
Compulsando os autos, verifico que o Prefeito Municipal, Senhor Emanuel Pinheiro, informou a este Tribunal que a manifestação seria devidamente encaminhada pela Secretaria Municipal de Gestão.
Em sua defesa, a Secretária Municipal de Gestão, Senhora Ozenira Félix Soares de Souza, alegou que as atividades de gerenciamento do quadro de pessoas, quais sejam, selecionar, contratar, controlar a frequência, pagar e acompanhar as demais ações de pessoas, regulamentadas pela Lei Complementar 359/2014 e o Decreto 5.881/2015, foram descentralizadas para a Secretaria Municipal de Saúde, por possuir um maior número de servidores.
Informou que, em virtude dessa descentralização das atividades, a Secretaria Municipal de Gestão iria somente apoiar as Secretarias com o maior contingente de pessoal. Desse modo, efetuou a contratação de uma instituição para a realização dos processos seletivos, a qual foi colocada à disposição da Secretaria Municipal de Saúde.
Contudo, pontuou que, em virtude do volume de trabalho da Secretaria Municipal de Saúde, prontificou-se a coordenar o andamento ao processo de seleção.
Justificou que a deflagração do certame não aconteceu por falta de encaminhamento do novo quadro de vagas, que seria de responsabilidade do Secretário Municipal de Saúde, anteriormente do ex- Secretário, Senhor Huark Douglas Correa e atualmente, o Senhor Luiz Antônio Possas de Carvalho, atual Secretário.
Justificou também que a Secretaria Municipal de Saúde suspendeu o levantamento das vagas para aguardar a inauguração do Hospital Municipal de Cuiabá, por considerar que poderia ocorrer um aumento das vagas, ou até mesmo a redução, ante a decisão de terceirização de algumas atividades e funções.
Ademais, encaminhou a este Tribunal as cópias dos Processos Administrativos 025.341/2018-1 e 043.310/2018-1 (Doc. Digitais 36594/2019 ao 36609/2019).
Após análise das defesas, a Secretaria de Atos de Pessoal apontou que a conduta efetuada pela Secretaria Municipal de Gestão, de descentralizar as atividades de gerenciamento do quadro de pessoas, está em desacordo com normas postas na Lei Complementar 359/2014 e o Decreto 5.881/2015.
Assinalou que as citadas normativas não deixam dúvidas quanto às responsabilidades da Secretaria Municipal de Gestão em gerir a política de Gestão de Pessoas no âmbito do Poder Executivo.
Desse modo, a Equipe Técnica compreendeu que o certame não foi deflagrado pela falta de planejamento das Secretarias Municipais de Gestão e de Saúde.
E, no que tange à paralisação do levantamento de vagas, em virtude da iminente inauguração do novo hospital, a SECEX apontou que não existe vinculação entre o Pronto Socorro Municipal, que é gerido pela Secretaria Municipal de Saúde, e o Hospital Municipal de Cuiabá, gerido pela Empresa Cuiabana de Saúde Pública.
Inicialmente, observo que a determinação constante na letra “b” foi devidamente cumprida pela Secretária Municipal de Gestão.
Já, no que conserne à determinação posta na letra “a”, destaco que o Edital do Processo Seletivo Simplificado deveria ter sido publicado até o dia 17 de dezembro de 2018.
Extrai-se dos autos que o Procedimento 025.341/2018 está na fase final, pois contém: o pedido de realização do Processo Seletivo Simplificado para a contratação de profissionais de áreas específicas da saúde, o Edital 1/2018/GAB/SMS, formulado pela ex-Secretária Municipal de Saúde, bem como, a estimativa de impacto, tanto mensal, quanto anual, formuladas pelo Coordenador de Desenvolvimento Humano da Secretaria de Saúde, ainda, o Parecer Jurídico 322/PAAL/PGM/2018, favorável a realização do certame, proferido pelo Procurador do Município.
Contudo, encontra-se paralisado na Secretaria Municipal de Gestão a mais de um ano, desde o dia 16/5/2018.
Pelo exposto, observo que essa Secretaria não se empenhou para a deflagração do processo seletivo simplificado, uma vez que deixou de cumprir suas competências regimentais, aprovadas pelo Decreto 5.881/2015, vejamos o que diz os incisos I e II do seu artigo 2º :
Art. 2º Compete a Secretaria Municipal de Gestão:
I – gerir a política de Gestão de Pessoas no âmbito do Poder Executivo Municipal;
II – gerir a política de formação e capacitação dos servidores e empregados públicos do Poder Executivo Municipal e promver a produção e a divulgação de conhecimentos;
[...]
Além disso, observo que o Secretaria Municipal de Saúde também não se empenhou para a deflagração do certame, pois suspendeu o levantamento das vagas para aguardar a inauguração do novo hospital.
Ocorre que a lentidão dos responsáveis para cumprir a determinação posta por este Tribunal está prejudicando a população mato-grossense.
Conforme já havia destacado, a matéria envolvida nos autos tem grande relevo social, uma vez que a saúde é um dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal, nos termos dos artigos 6º e 196 ao 200.
Assim, a conduta dos responsáveis está infringindo não só as determinações desta Casa, mas também, as normas constitucionais.
O direito fundamental ferido neste processo é uma irregularidade insanável, uma vez que estamos tratando do próprio direito à vida da população. Ora, como poderia a Secretaria Municipal de Saúde justificar que um óbito ocorreu pela falta de médico? Como poderia uma vida aguardar a contratação de um médico somente após a inauguração de um novo hospital? Não pode o Tribunal de Contas deixar de fiscalizar uma situação grave como essa.
Conforme demonstrado, a defesa alegou que o procedimento aguardava a inauguração do novo hospital para a finalizar o levantamento das vagas e, então, a sua deflagração.
Ocorre que as divulgações nas mídias sociais vêm destoando da defesa apresentada, para tanto, descrevo abaixo as notícias relevantes ao presente caso:
Desse modo, verifico que a defesa não pode prosperar, pois considerando as divulgações constates nas mídias sociais, fazem 8 meses em que a gestão do novo hospital foi transferida para a Empresa Cuiabana de Saúde Pública.
E, conforme destacou a Equipe Técnica, não existe vinculação entre o Hospital e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá, Doutor Henrique de Aquino, que é gerido pela Secretaria Municipal de Saúde, e o Hospital Municipal de Cuiabá, Doutor Leony Palma de Carvalho, gerido pela Empresa Cuiabana de Saúde Pública.
Esclareço que as duas unidades de saúde devem oferecer atendimentos ao Sistema Único de Saúde, o qual é mantido pelo Poder Público e foi instituído pela Constituição Federal com o intuito de oferecer ações e serviços de saúde para toda a população brasileira.
Assim, a Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá é responsável pelas questões de saúde pública da população cuiabana.
Verifico, assim, que a Secretaria Municipal de Saúde encontra-se em situação alarmente, uma vez que o quadro de pessoal está desfalcado, ocasionando prejuízo à população.
Há mais de um ano este Tribunal aguarda a deflagração do Processo Seletivo Simplificado para o preenchimento temporário das vagas desta Secretaria.
Conforme desmonstrado nas divulgações das mídias sociais, a Empresa Cuiabana divulgou há mais de 3 meses o Edital 1/2019/ECSP, referente ao Processo Seletivo Simplificado, para a contratação temporária imediata e formação de cadastro de reserva de profissionais para a atuação na área de saúde, apenas para o novo Hospital Municipal de Cuiabá, Doutor Leony Palma de Carvalho.
Vale ressaltar que a referida empresa pública é de direito privado, pertencente à Administração Indireta (descentralização), e foi criada para a ampliação do atendimento ao SUS, e ainda, para garantir a melhor aplicação dos recursos públicos.
A Lei 13.303/2016, que dispõe sobre a o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, regulamenta nos artigos 89 e 90 um ponto importante em relação a sua autonomia, vejamos:
Art. 89. O exercício da supervisão por vinculação da empresa pública ou da sociedade de economia mista, pelo órgão a que se vincula, não pode ensejar a redução ou a supressão da autonomia conferida pela lei específica que autorizou a criação da entidade supervisionada ou da autonomia inerente a sua natureza, nem autoriza a ingerência do supervisor em sua administração e funcionamento, devendo a supervisão ser exercida nos limites da legislação aplicável.
Art. 90. As ações e deliberações do órgão ou ente de controle não podem implicar interferência na gestão das empresas públicas e das sociedades de economia mista a ele submetidas nem ingerência no exercício de suas competências ou na definição de políticas públicas.
Portanto, não se pode confundi-la com órgão público municipal ou como pertencente à Secretaria Municipal de Saúde, pois não se trata de desconcentração da administração pública, mas de descentralização.
Assim, não vejo o motivo pelo qual as Secretarias Municipais de Saúde e de Gestão ainda não finalizaram o levantamento do quadro de vagas para a deflagração do Processo Seletivo Simplificado que irá preencher as vagas temporárias da Secretaria Municipal de Saúde, atendendo à notória e urgente demanda do Hospital e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá, Doutor Henrique de Aquino.
Diante das exposições fáticas, acompanho o posicionamento Técnico no sentido de que a determinação constante no item III.a do Acórdão 589/2018 – TP não foi cumprida pela ausência de esforços do Prefeito Municipal de Cuiabá, da Secretária Municipal de Gestão e do Secretário Municipal de Saúde.
IV) a notificação dos Srs. Luiz Antônio Possas de Carvalho, Emanuel Pinheiro e Ozenira Félix Soares de Souza para que, sob pena de multa diária no montante de 10 UPFs/MT, nos termos do artigo 297, § 1º, da Resolução 14/2007, encaminhassem, no prazo de até 15 dias, a proposta de cronograma de concurso público para o provimento de cargos da área da saúde, enfatizando sua área fim;
Quanto à aplicação desta determinação, esclareço que a Secretaria Municipal de Saúde possui um número de contratos temporários acima do permitido por lei.
Destaco ainda, que o último concurso realizado por essa pasta ocorreu em 2014, razão pela qual, foi determinado o envio do cronograma para prosseguir com o andamento de um novo concurso, visando ao preenchimento das vagas da Secretaria Municipal de Saúde.
Na oportunidade, a Secretária Municipal de Gestão encaminhou o Ofício 1359/GAB/SMGE/2018, o qual foi solicitado ao Chefe do Executivo a autorização expressa para dar início aos trâmites necessários à abertura do concurso público.
A autorização foi emitida pelo Prefeito Municipal, Senhor Emanuel Pinheiro, no dia 27/12/2018, solicitando à Secretaria Municipal de Gestão que as providências fossem proferidas nos moldes das notificações do Tribunal de Contas do Estado e do Ministério Público do Estado.
Porém, a Secretária Municipal de Gestão, Senhora Ozenira Félix Soares de Souza, informou que o certame é de responsabilidade da Secretaria Municipal de Saúde, e que ainda não foi formalizado o cronograma porque a banca para a realização do certame encontra-se em processo de contratação.
Em contrapartida, o Secretário Municipal de Saúde, Senhor Luiz Antônio Possas de Carvalho, alegou, em sua defesa que, o cronograma do concurso está passando por fases de criação e planejamento, visto que o certame irá atender às necessidades da Secretaria Municipal de Saúde e do Novo Hospital Municipal.
Após análise da defesa, a SECEX de Atos de Pessoal apontou que diversos processos de seleção da Prefeitura Municipal de Cuiabá foram realizados pelo Instituto Nacional de Seleções e Concursos –Selecon. Inclusive, o Processo Seletivo Simplificado para contratos temporários imediatos e formação de cadastro de reserva 01/2019/ECSP está sendo realizado pelo citado instituto.
Porém, constatou que nenhum documento foi apresentado para comprovar a contratação da banca para realização do certame, e por essa razão, concluiu que as justificativas apresentadas demonstram a ausência de planejamento e demora na tomada de decisões dessas Secretarias.
Pelo exposto, coaduno com a conclusão da Equipe Técnica.
Pois bem. Conforme os elementos fáticos e probatórios elencados na análise do não cumprimento das Determinações III.a e IV contidas no Acórdão 598/2018 – TP, e ainda, diante da relevância social da matéria envolvida no presente processo, entendo por modificar a medida cautelar aplicada, no sentido de majorar a multa diária aplicada.
Para tanto, ressalto que o valor da multa poderá ser modificado se for verificada a sua insuficiência ou sua excessividade, com fundamento no § 2º do artigo 297 do Regimento Interno deste Tribunal, o qual colaciono abaixo:
Art. 297. No curso de qualquer apuração, o Tribunal Pleno ou o julgador singular poderá determinar medidas cautelares de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público de Contas ou de unidade técnica do Tribunal.
§ 1º. O Tribunal Pleno ou o julgador singular poderão fixar multa diária por descumprimento da medida cautelar, para garantia de seu cumprimento.
§ 2º. O Tribunal Pleno, por provocação de qualquer de seus membros, depois de homologada a cautelar, ou o Relator, de ofício, antes da homologação, poderão modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifiquem que se tornou insuficiente ou excessiva.
§ 3º. Após a concessão da medida cautelar, os autos serão remetidos imediatamente ao Ministério Público de Contas, para manifestação no prazo de 03 (três) dias, quando a medida não houver sido por este requerida.
Feitas essas considerações, reitero que, o fumus boni iuris decorreu da constatação inicial de 4 achados de Auditoria (KB17, KB01, KB06 e MB02), de natureza grave, conforme constam do Relatório Técnico Preliminar.
Ademais, destaco a permanência e agravamento do periculum in mora, pois a não concessão das determinações supracitadas, especialmente a de deflagração do Processo Seletivo Simplificado, até o advento do novo Concurso Público, poderá acarretar grave prejuízo ao interesse coletivo, à saúde e até mesmo à vida dos que necessitam dos serviços públicos de saúde.
Conforme exposições anteriores, o direito fundamental ferido neste processo é uma irregularidade insanável, uma vez que estamos tratando do próprio direito à vida da população.
Em cognição sumária, antevejo o risco da nefasta ocorrência do que a doutrina denomina de eutanásia social passiva, também intitulada de mistanásia passiva (do grego “mis”, infeliz, e “thanatos”, morte; morte antes e fora da hora, provocada de forma lenta e sutil por sistemas e estruturas), conforme bem explanado pelos juristas Dirceu Pereira Siqueira e Bruna Furini Lazaretti (Eutanásia Social e os Direitos da Personalidade: uma leitura constitucional crítica. Argumenta Journal Law. n. 30, p. 297-239, jan/jun 2019).
Nesse sentido, transcrevo as lições de Márcia Helena Mendonça e Marco Antônio Monteiro:
A mistanásia passiva, por sua vez, seria aquela na qual a pessoa passa por um processo de “nadificação” em decorrência da falta de acesso aos serviços de saúde ou de erro médico. Ela se traduz na inacessibilidade da pessoa ao tratamento necessário à preservação de sua saúde, ou, ainda, a acessibilidade precária, ou seja, a falta de condições satisfatórias para seu tratamento (MENDONÇA, Márcia Helena; DA SILVA, Marco Antônio Monteiro. Vida, dignidade e morte: cidadania e mistanásia. Revista Ius Gentium, v. 9, n. 5, 2014, p. 177).
Sobre o tema, Leonard Martin, em consonância com os supracitados autores, esclarece:
Na categoria de mistanásia, percebe-se três situações distintas: primeiro, a grande quantidade de doentes e deficientes que, por motivos políticos, sociais e econômicos, não chegam a ser pacientes, pois não conseguem ingressar efetivamente no sistema de atendimento médico; segundo, os doentes que conseguem ser pacientes para, em seguida, se tornarem vítimas de erro médico e; terceiro, os pacientes que acabam sendo vítimas de má-prática por motivos econômicos, científicos ou sociopolíticos. A mistanásia é uma categoria que nos permite levar a sério o fenômeno da maldade humana (MARTIN, Leonard. Eutanásia e Distanásia. In: FERREIRA, Sérgio Costa; OSELKA, Gabriel; GARRAFA, Volnei (org). Iniciação à Bioética. Brasília: Conselho Federal de Medicina, 1998, p. 174).
Desse modo, nos termos dos fundamentos acima e do artigo 82, da Lei Complementar 269/2007, tenho como presente na espécie o fumus boni iuris e o periculum in mora e entendo que a multa aplicada no presente processo (Acórdão 598/2018 – TP) foi insuficiente e, para atender a urgência do caso e evitar mais danos à população, decido pela sua majoração e pela reiteração dos itens III.a e IV, do Acórdão 589/2018, com a majoração da multa diária para 50 UPFs.
Entendo ainda que o Senhor Luiz Antônio Possas de Carvalho deverá ser incluído na determinação posta no item III.a, uma vez que as justificativas apresentadas pela Secretária Municipal de Gestão, Senhora Ozenira Félix Soares de Souza, demonstraram que o atual Secretário Municipal de Saúde não encaminhou o quadro de vagas, imprescindível à deflagração do certame.
ISSO POSTO, com fulcro no artigo 82 e seguintes da Lei Complementar 269/2007 e artigo 297 e seguintes do RITCE-MT, determino:
I - a NOTIFICAÇÃO do Senhor Emanuel Pinheiro, Prefeito de Cuiabá,da Senhora Ozenira Félix Soares de Souza, Secretária Municipal de Gestão, bem como, o Senhor Luiz Antônio Possas de Carvalho, Secretário Municipal de Saúde, para que, sob pena de multa diária no montante de 50 UPFs, nos termos do artigo 297, §1º, do RITCE-MT e artigo 311, inciso IV, do Novo Código de Processo Civil, c/c o artigo 144 da Resolução Normativa 14/2007-TP, para que deflagrem o Processo Seletivo Simplificado concernente aos Processos Administrativos 025.341/2018-1 e 043.310/2018-1, publicando o edital em até quinze dias, observando-se os requisitos legais e constitucionais para a lisura, publicidade, impessoalidade e competitividade do certame.
II - a NOTIFICAÇÃO do Secretário Municipal Interino de Saúde de Cuiabá, Senhor Luiz Antônio Possas de Carvalho, do Prefeito de Cuiabá, Senhor Emanuel Pinheiro, e da Secretária Municipal de Gestão de Cuiabá, Senhora Ozenira Félix Soares de Souza, para que, sob pena de multa diária no montante de 50 UPFs, nos termos do artigo 297, §1º, do RITCE-MT, encaminhem, no prazo de até 15 dias, a proposta de cronograma de Concurso Público para o provimento de cargos da área da saúde, enfatizando sua área fim.
Advirtam-se os aludidos Agentes Públicos que estarão sujeitos à multa no caso de desobediência, na forma prevista no artigo 75, inciso IV, da Lei Complementar 269/2007.
Atento aos postulados da economia e da celeridade processual, os atos de citação dos referidos servidores públicos deverão ser efetivados por meio dos mesmos instrumentos que formalizarão as notificações para cumprimento da medida cautelar.