Se em "Memórias Póstumas de Brás Cubas" o autor usou a invenção do emplasto como uma metáfora para o entusiasmo desmedido pela ciência e tecnologia, hoje podemos traçar paralelos claros com o fascínio pela IA.
O mundo contemporâneo vibra ao som de uma nova revolução: a da Inteligência Artificial.
No entanto, ao observar esse fervor com que se abraçam essas novidades, é impossível não lembrar da figura irônica e contraditória de Brás Cubas, personagem criado pelo mestre Machado de Assis — ainda mais agora, que “na gringa”, o “Bruxo do Cosme Velho” está no hype.
Se em "Memórias Póstumas de Brás Cubas" o autor usou a invenção do emplasto como uma metáfora para o entusiasmo desmedido pela ciência e tecnologia, hoje podemos traçar paralelos claros com o fascínio pela IA.
Em sua narrativa post-mortem, Brás Cubas nos oferece um reflexo mordaz de nossas ambições e fraquezas.
Seu emplasto, uma panaceia destinada a curar todos os males humanos, é a própria personificação do otimismo cego que, vira e mexe, ainda nos acomete.
A promessa de uma cura universal que não se concretiza, que se revela em um fracasso ressonante, é um lembrete esquio das limitações humanas e das armadilhas do progresso desmedido.
Na atualidade, a Inteligência Artificial surge como a nova panaceia, a prometer eficiência e precisão em áreas como auditoria, controle interno e externo, nas quais a lógica, quase que algorítmica, reina.
Entretanto, a ironia machadiana nos adverte: confiar cegamente na tecnologia, sem a devida cautela e sem a aliança com o discernimento e ética humanos, pode levar a desfechos inesperados e, muitas vezes, desastrosos.
Machado de Assis, com sua sagacidade imortal, nos mostra que a confiança desmedida na ciência pode nos conduzir a um lugar de arrogância e cegueira.
Assim como o emplasto de Brás Cubas foi uma tentativa fútil de resolver problemas complexos com uma solução simplista, a IA não deve ser vista como uma varinha mágica que resolverá todos os dilemas da humanidade. A tecnologia, por mais avançada que seja, não substitui a necessidade de um julgamento ético e responsável.
Em "Memórias Póstumas de Brás Cubas", a crítica à busca incessante pelo progresso material e o sucesso superficial é clara.
Em nossa época, em que a eficiência e a produtividade são quase deidades, a IA é exaltada como o ápice dessas virtudes. Porém, é crucial lembrar que, sem uma base ética sólida, sem a integridade e o discernimento moral, a eficiência pode se tornar uma ferramenta de desumanização e desigualdade.
Assim, ao integrar a IA às práticas profissionais em que se exige, muitas vezes, uma lógica cartesiana, mas que, invariavelmente, tem efeitos sociais, devemos manter viva a lição machadiana: a tecnologia deve ser uma aliada, nunca uma substituta para o julgamento humano.
A inovação tecnológica oferece promessas tentadoras, mas é nossa responsabilidade usá-la com discernimento, a garantir que o avanço não venha às custas da nossa humanidade.
Os escritos de Machado de Assis, que ressoam através dos séculos, convidam-nos a refletir sobre o entusiasmo contemporâneo com a IA, de modo que, possamos, com uma perspectiva crítica e equilibrada, integrá-la em nossas vidas sem perder de vista aquilo que nos torna humanos — a nossa agudeza de espírito.
Ps. Em respeito aos leitores e ante razões éticas, informamos que esta crônica contou com suporte revisional da IA Copilot, da Microsoft.
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Jocimauro Bento do Carmo e mestrando em Função Social do Direito pela FADISP, técnico de Controle Externo e consultor técnico jurídico da Comissão Permanente de Infraestrutura, Tecnologia e Desestatização (COPITED) do TCE-MT. Valteir Teobaldo Santan é advogado, consultor, DPO SERPRO DataShield e encarregado de Dados do TCE-MT.