:: Tribunal de Contas - MT

Como a administração pública pode superar a pobreza em um dos estados mais ricos do Brasil

08/07/2023

Sem uma política local de desenvolvimento bem definida ou alinhada à dinâmica econômica de Mato Grosso, Várzea Grande sofre há muitas décadas com o descompasso entre o crescimento populacional e a perda de capacidade produtiva. O déficit econômico tem reflexo direto na garantia de bem-estar social e de acesso a direitos básicos, como alimentação, saúde e educação. 

Para se ter ideia do problema, 52% da população da cidade se encontra em situação de vulnerabilidade, sendo crianças e adolescentes,  37% desta porcentagem. Problema que não se restringe à Várzea Grande. No ano passado, Mato Grosso tinha 38% de seus cidadãos em situação de extrema pobreza, segundo dados do Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento (PNUD). 

Isso significa que, em um dos estados mais ricos do país e um dos maiores produtores agropecuários do mundo, há 550 mil famílias em situação de vulnerabilidade, pobreza e extrema pobreza. Nestes casos, os rendimentos do trabalho são de até R$105 por pessoa do domicílio ao mês. Estamos falando de pessoas que não sabem quando ou se farão uma refeição.  

Frente ao problema, a Comissão Permanente de Saúde e Assistência Social (CPSA) do Tribunal de Contas (TCE-MT) começa a abrir caminhos para que os políticos e a própria população se atentem à questão. O que esperamos com este movimento é garantir políticas de assistência social mais efetivas, que considerem a extensão do estado e as profundas diferenças socioeconômicas que marcam nossas regiões.

A atuação da Comissão também inaugura uma nova dinâmica na fiscalização sobre o setor, que, até então, não vinha sendo auditado. Ora, se ainda há um longo caminho rumo à equalização de acessos e à redução das desigualdades, de modo que ainda dependeremos de iniciativas assistencialistas por muitos anos, o Tribunal não pode se omitir. Estes investimentos, portanto, passam a ser monitorados mais de perto. 

O desafio é imponente. Tomando Várzea Grande novamente como exemplo, observamos que a cobertura da demanda na rede preventiva de vulnerabilidades e riscos sociais do Sistema Único de Assistência Social já apresenta um déficit de 127%. Tal porcentagem confirma a urgência de nosso trabalho para a estruturação de uma política local de proteção social. 

Mas os esforços devem alcançar outras frentes. Ou seja, é preciso ainda atenção sobre a geração de emprego e renda e sobre o desenvolvimento de estratégias que neutralizem efeitos transversais à pobreza, como aumento da violência, crescimento da população em situação de rua, da informalidade, o surgimento e de doenças causadas pela alimentação inadequada, o preconceito e a exclusão social.

Esses déficits sociais não são novidade para nenhum gestor ou agente político. Ao mesmo tempo, são obstáculos muito maiores do que atores ou municípios, por si só, podem superar. O que buscamos é uma solução bem mais complexa, que esbarra em mecanismos de um sistema burocrático, desigual e injusto, característico da própria construção histórica e social do país.  

É por isso que a Comissão tem foco em uma atuação conjunta e inteligente, que norteie as ações da administração pública para além da fiscalização de recursos, quase sempre limitados. Só assim é que as ferramentas destinadas ao provimento de saúde, assistência social, escolarização e segurança, entre outras, terão o devido alcance e poderão criar um cenário melhor para o futuro.




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Guilherme Antonio Maluf

Guilherme Antonio Maluf é graduado em Medicina pela Universidade de Santo Amaro (1986). Fez residência médica em Cirurgia-geral pela Universidade de São Paulo (USP) (1988-1990). É especialista em Cirurgia-geral e Endoscopia Digestiva pela USP (1991). Pós-graduado em Gerente de Cidades pela FAAP-SP (2013). Mestre em Administração Pública pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa - IDP. Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP. Foi vereador por Cuiabá (2005-2006). Deputado Estadual por quatro mandatos (2007-2010/ 2011-2014/ 2015-2018/ 2019-2022). Secretário de Saúde de Cuiabá (2007-2008). Presidente da Assembleia Legislativa (2015-2017). Primeiro Secretário da Assembleia Legislativa (2017-2019). Governador Interino de Mato Grosso (abril 2016 - cinco dias). Tomou posse como Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso - TCE-MT em 1/3/2019. Atualmente, exerce o cargo de vice-presidente do TCE-MT e de presidente da Comissão Permanente de Saúde, Previdência e Assistência Social do TCE-MT.