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Inclusão é ferramenta para reparação de injustiças e redução de desigualdades

22/09/2023

Em Setembro a cor verde nos lembra do Mês Internacional da Pessoa com Deficiência, celebrado nacionalmente no dia 21.

Em Setembro a cor verde nos lembra do Mês Internacional da Pessoa com Deficiência, celebrado nacionalmente no dia 21. Na data, reflexões sobre a construção de uma sociedade justa e inclusiva apontam para um enorme desafio: reestruturar um modelo que invisibiliza milhões de cidadãos e os afasta de seus direitos básicos, isolando-os pela falta de representatividade e de acesso a espaços de cultura, educação e trabalho. 

Este é um cenário no qual todos os brasileiros perdem, já que a conjuntura retroalimenta ciclos intergeracionais de pobreza, acentuando a desigualdade de renda e os problemas que dela decorrem. Para se ter ideia, dos 41,9 mil (17,6%) autodeclaradas vulneráveis à pobreza inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) são pessoas com deficiência.  

Em Mato Grosso, este grupo populacional é significativo demais para não ser percebido. Segundo dados de 2022, apurados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), compunham esse perfil 319 mil pessoas ou 9,3% da população estadual com dois anos de idade ou mais. Metade deste conjunto diz respeito aos responsáveis domiciliares, sendo 46% homens e 54% mulheres.  

Considerando o perfil etário, os cidadãos com 14 anos e mais de idade, ou pessoas na idade apropriada para o trabalho (11%) possuem alguma deficiência (302 mil pessoas). Deste total, 61,6% estão fora do mercado, mais que o dobro do observado entre as pessoas sem deficiência (29,5%). Os números reforçam a ameaça de vulnerabilidade socioeconômica entre este grupo, que é agravada conforme avança a idade.  

É preciso considerar ainda outro dado importante, referente aos níveis salariais, que, na média, correspondem a R$2,96 mil entre pessoas sem deficiência e a R$2,47 mil entre pessoas com deficiência. Ou seja, a média mensal é 17% maior no primeiro caso. Além disso, mesmo considerando os trabalhadores com formação superior a diferença ainda ultrapassa os 18%. 

No contexto das pessoas com deficiência, quando esses aspectos gerais se particularizam, tornam-se fortes fatores de formação de vulnerabilidades socioeconômicas, especialmente porque se somam a uma herança histórica de invisibilização. E o acesso ampliado desse público a políticas públicas é a única estratégia capaz de reverter esse quadro.   

Na condição de cidadão mato-grossense e Presidente da Comissão Permanente de Saúde e Assistência Social do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT), vejo que o tema tem potencial para avançar.  Mas, para isso, é preciso mobilização entre os diversos setores e entre os gestores públicos municipais e estaduais, que devem direcionar esforços para questões prioritárias. 

A carência de atendimento de saúde adequado nos municípios, por exemplo, nos dá uma pista do que pode começar a ser feito. Segundo levantamento realizado pelo Ministério Público Estadual em 2019, havia 106 unidades de atendimento e assistência a pessoas com deficiência em 70 municípios, sendo que 26 estavam localizadas em Cuiabá (37%) e 68 (64%) eram Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE). 

O desafio estruturante também precisa de representatividade legislativa e normatização para ser superado. Entendendo a insuficiência desses elementos no estado, quando exercia mandato parlamentar na Assembleia Legislativa de Mato Grosso, entre 2015 e 2019, apresentei 13 proposições para ampliar direitos e acessos a este público específico. Dentre as propostas, quatro tornaram-se leis estaduais.

A última delas, sancionada em julho deste ano pelo governador Mauro Mendes, é a Lei Estadual n.º 12.218/2023, que busca corrigir obstáculos e acabar com constrangimentos sofridos por deficientes visuais. A norma torna obrigatório que as empresas concessionárias de serviços públicos no estado emitam, mediante solicitação, correspondência e documentos em sistema Braille.  

Além do mais, os empreendimentos devem instalar equipamentos de informática, com sintetizadores de voz e de audiodescrição, adequados ao atendimento das pessoas com deficiência visual em suas agências de atendimento. 

Estes são só alguns exemplos de caminhos que podemos seguir. Com união de esforços, empatia, inovação e, sobretudo, comprometimento com a Constituição Federal, que assegura direitos iguais a todos os cidadãos, é possível remodelarmos Mato Grosso. Só assim, pessoas com deficiência terão igualdade de oportunidades em todos os aspectos de suas vidas e todos nós viveremos em um estado justo e humano. 




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Guilherme Antonio Maluf

Guilherme Antonio Maluf é graduado em Medicina pela Universidade de Santo Amaro (1986). Fez residência médica em Cirurgia-geral pela Universidade de São Paulo (USP) (1988-1990). É especialista em Cirurgia-geral e Endoscopia Digestiva pela USP (1991). Pós-graduado em Gerente de Cidades pela FAAP-SP (2013). Mestre em Administração Pública pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa - IDP. Doutorando em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP. Foi vereador por Cuiabá (2005-2006). Deputado Estadual por quatro mandatos (2007-2010/ 2011-2014/ 2015-2018/ 2019-2022). Secretário de Saúde de Cuiabá (2007-2008). Presidente da Assembleia Legislativa (2015-2017). Primeiro Secretário da Assembleia Legislativa (2017-2019). Governador Interino de Mato Grosso (abril 2016 - cinco dias). Tomou posse como Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso - TCE-MT em 1/3/2019. Atualmente, exerce o cargo de vice-presidente do TCE-MT e de presidente da Comissão Permanente de Saúde, Previdência e Assistência Social do TCE-MT.